carta de refugiado

sentir? o céu escurece. os sentidos caem para o mar ensanguentado. sentir-me português, dizias-me? basta olhar em volta: uma paisagem de terra distante faz-nos não ter pátria, faz-nos esquecer o espírito guerreiro, (os tais doidos varridos caralho!) que haviam entrado mar adentro com naus a apodrecer e a cheirar mal... eu vivo num esquecimento. fui esquecido pelo tempo, o amor abandonou-me muito cedo, o mar soltou a ira para meu desaparecimento. que te hei-de dizer? não sei quem me escrevo, os dias incomodam-me, as rotinas corroem-me, a vida atormenta-me... e só me resta a morte, essa, de tão natural, alivia-me do flagelo... tudo o resto deixa-me deprimido. já tudo se tornou igual, mesmo o inesperado já o havia esperado... mesmo uma voz diferente, um rosto desconhecido, na minha alma soam-me repetidos. e isso, creio, para um jovem como eu, é já como se fosse um fim precoce. o por termo à minha vida nunca me intrigou. tornei-me um espelho estilhaçado com ...